Pesquisa realizada na Inglaterra mostra que um em cada seis terapeutas usa práticas para "curar" a homossexualidade de seus pacientes. Especialistas ouvidos por ÉPOCA refutam esse tipo de tratamento, que pode ser perigoso para quem busca conviver com sua sexualidade
DANILO CASALETTI
Na Inglaterra
Pesquisa mostra que terapeutas ainda tentar 'curar' os gays
Pesquisa mostra que terapeutas ainda tentar 'curar' os gays
"Hoje vivo uma sexualidade sadia”. É como essa frase de alívio que a carioca Claudia Machado, de 34 anos, lembra-se da fase em que tentou negar, e, depois, reverter a sua homossexualidade. Nascida em uma família humilde, Cláudia foi criada dentro de uma religião que classificava como pecado a homossexualidade. “Passava dias e dias rezando para expulsar meus sentimentos de dentro mim”, diz. Cláudia namorou rapazes e chegou a ficar noiva, aos 24 anos. Na época, encontrou um outro grupo religioso que prometia "curar" sua preferência sexual. “Negava meu desejo. Quase fiquei louca. Viajava para pregar dizendo que havia me 'libertado' da homossexualidade, mas sentia desejo pelas minhas companheiras de quarto”, afirma.
A verdadeira libertação, segundo Cláudia, veio quando passou a aceitar que gostava de pessoas do mesmo sexo. Procurou um grupo de apoio para lésbicas no Rio de Janeiro e descobriu que o que sentia, na verdade, não era uma doença. Conheceu sua companheira, com quem vive há 10 anos, e passou a militar pela causa dos homossexuais. Em 2003, foi chamada pelo hoje ministro do Meio Ambiente Carlos Minc para participar de um debate na Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro sobre um projeto que pretendia legalizar um tratamento para reversão de gays. “Graças a Deus essa maluquice não foi aprovada”, diz.
Não há nenhum tratamento para a homossexualidade, que, desde dos anos 90, foi retirada da lista de doenças mentais, mas casos como o de Cláudia, de tentativa de "reversão", são mais comuns do que se imagina. Dentro dos consultórios, inclusive, como mostrou uma recente pesquisa divulgada na Inglaterra. Um estudo com 1400 psiquiatras e terapeutas publicado pela revista especializada BMC Psychiatry concluiu que um em cada seis profissionais admite ter tratado pelo menos um paciente para alterar os seus sentimentos homossexuais, mesmo sabendo que a prática é condenada pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
De acordo com o estudo, as entidades religiosas são as que mais estimulam a crença de que a homossexualidade pode ter "cura". Em um artigo publicado no jornal britânico The Independent, o professor Michael King, da Universidade College Medical School, em Londres, afirma que os jovens encontram esse tipo de promessa principalmente na internet e depois levam a questão para seus terapeutas. “Se o terapeuta não tem bom senso o suficiente para dizer que o desejo homossexual é uma parte deles e não há nada patológico nisso, os pacientes podem ser seduzidos a tentar a reversão”, afirma King.
A verdadeira libertação, segundo Cláudia, veio quando passou a aceitar que gostava de pessoas do mesmo sexo. Procurou um grupo de apoio para lésbicas no Rio de Janeiro e descobriu que o que sentia, na verdade, não era uma doença. Conheceu sua companheira, com quem vive há 10 anos, e passou a militar pela causa dos homossexuais. Em 2003, foi chamada pelo hoje ministro do Meio Ambiente Carlos Minc para participar de um debate na Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro sobre um projeto que pretendia legalizar um tratamento para reversão de gays. “Graças a Deus essa maluquice não foi aprovada”, diz.
Não há nenhum tratamento para a homossexualidade, que, desde dos anos 90, foi retirada da lista de doenças mentais, mas casos como o de Cláudia, de tentativa de "reversão", são mais comuns do que se imagina. Dentro dos consultórios, inclusive, como mostrou uma recente pesquisa divulgada na Inglaterra. Um estudo com 1400 psiquiatras e terapeutas publicado pela revista especializada BMC Psychiatry concluiu que um em cada seis profissionais admite ter tratado pelo menos um paciente para alterar os seus sentimentos homossexuais, mesmo sabendo que a prática é condenada pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
De acordo com o estudo, as entidades religiosas são as que mais estimulam a crença de que a homossexualidade pode ter "cura". Em um artigo publicado no jornal britânico The Independent, o professor Michael King, da Universidade College Medical School, em Londres, afirma que os jovens encontram esse tipo de promessa principalmente na internet e depois levam a questão para seus terapeutas. “Se o terapeuta não tem bom senso o suficiente para dizer que o desejo homossexual é uma parte deles e não há nada patológico nisso, os pacientes podem ser seduzidos a tentar a reversão”, afirma King.
Como não é doença, não há cura
Segundo Carmita Abdo, psiquiatra e coordenadora geral do ProSex (Projeto de Sexualidade do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo), todo homossexual que for egodistônico, ou seja, que não aceitar sua condição sexual e tiver conflito em relação à sua sexualidade pode ser tratado por um psiquiatra ou terapeuta. Não para reverter ou mudar a sua tendência, mas para tentar se adaptar à sua condição. Essa é a orientação da OMS, que há 15 anos tirou da homossexualidade o status de "doença mental". ”Todos os tratamentos aplicados até então para curar um homossexual não davam certo, pelo contrário, tornavam a situação dele ainda mais crítica”, diz Carmita.
Para ela, a tentativa de "reverter" a homossexualidade de um paciente acabava por deixá-lo mais confuso. “Esse tipo de tratamento cria um conflito entre o que ele deseja ser e o que ele consegue ser”, afirma a psiquiatra. Para Carmita, nos dias atuais, um profissional de saúde não pode fazer uma escolha de como tratar um homossexual, uma vez que existe um consenso, uma diretriz da OMS que diz que não existe uma doença e, portanto, não há uma cura para ela. “Um psiquiatra não pode optar por reverter ou não a homossexualidade de um paciente. Ele precisa trabalhar para que seu paciente se sinta confortável com a sua orientação sexual”, diz. Para Carmita, o resultado da pesquisa mostra que alguns profissionais ainda pensam e atuam dentro do parâmetro antigo, quando a homossexualidade era considerada uma doença e a reversão era perfeitamente aceita. Bastante praticada entre as décadas de 50 e 60, a tentativa de "curar" a homossexualidade era tida como viável porque se acreditava que o comportamento psicológico era decisivo para a orientação sexual.
Mas a ideia da cura da homossexualidade muitas vezes parte do próprio paciente. O psicólogo Cláudio Picazio, autor dos livros Diferentes desejos e Sexo secreto (Editoras Summus), conta que é comum receber em seu consultório pacientes que pedem uma mudança em seus desejos. “Nesses casos, meu papel é fazer com que ele assuma o seu desejo, mesmo que não queira colocá-lo em prática. Reprimi-lo só piora as coisas”, afirma. Picazio explica que a repressão desse desejo pode colocar o indivíduo em situações de risco. “É como acontece com essas dietas radicais. Um dia, a pessoa não aguenta e come uma torta inteira”, diz. “Nessas horas, a pessoa acaba fazendo sexo sem preservativo, frequenta lugares isolados, procura parceiros em saunas, sai com garotos de programa”.
Picazio afirma que, muitas vezes, esse conflito, ou seja, o incômodo com a atração por alguém do mesmo sexo, pode acontecer porque existe uma diferença em ter desejos homossexuais e ter, eventualmente, uma atitude homossexual. “Um exemplo disso são os adolescentes que, em fase de experimentação, acabam tendo relações com pessoas do mesmo sexo”, diz. Segundo Picazio, um psicólogo também pode ajudar o paciente a entender o que sente e orientar de que maneira ele pode viver ou não esse desejo. “Reprimir isso a vida toda é muito difícil, mas se isso for uma escolha da pessoa, tenho que ajudá-la”.
Outra situação muito comum nos consultórios são pais que levam seus filhos, principalmente adolescentes, assim que percebem alguma inclinação homossexual. “Muitos pais me dizem que vão colocar os filhos no jiu-jitsu para que virem heterossexuais”, diz. Segundo Picazio, é preciso, nesse caso, atender os pais para mostrar que não se muda um desejo sexual. “É preciso trabalhar neles a frustração de ter um filho gay ou uma filha lésbica”, afirma
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